QUANDO NIETZSCHE OROU

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Imagem de Assim Falava Zaratustra - no Céu dos Quadrinhos , HQ de Thaís dos Anjos

Foi Leonardo Boff quem traduziu e divulgou no Brasil a Oração ao Deus Desconhecido, publicada em seu livro Transcendência, de 2000 - Editora Vozes.

Nietzsche, o mesmo que decretara A Morte de Deus, aqui, com o mesmo Deus conversa e a Ele entrega-se, nesta quase-poesia, com fervor de crente.

Oração ao Deus Desconhecido

( Friedrich Nietzsche - tradução de Leonardo Boff)


Antes de prosseguir em meu caminho e lançar o meu olhar para frente uma vez mais, elevo, só, minhas mãos a Ti na direção de quem eu fujo.
A Ti, das profundezas de meu coração, tenho dedicado altares festivos para que, em Cada momento, Tua voz me pudesse chamar.
Sobre esses altares estão gravadas em fogo estas palavras:
"Ao Deus desconhecido”.
Seu, sou eu, embora até o presente tenha me associado aos sacrílegos.
Seu, sou eu, não obstante os laços que me puxam para o abismo.
Mesmo querendo fugir, sinto-me forçado a servi-lo.
Eu quero Te conhecer, desconhecido.
Tu, que me penetras a alma e, qual turbilhão, invades a minha vida.
Tu, o incompreensível, mas meu semelhante, quero Te conhecer, quero servir só a Ti.

O Deus Vivo

É que Nitzsche, em A Morte de Deus, não se referia a Ele, Ele mesmo, em Pessoa, mas a um Deus religioso, criado, imposto, manipulado pela Religião. Este, sim, para ele, um deus-morto, assassinado pelos homens.

"Deus está morto! Deus permanece morto! E quem o matou fomos nós! Como haveremos de nos consolar, nós os algozes dos algozes? O que o mundo possuiu, até agora, de mais sagrado e mais poderoso sucumbiu exangue aos golpes das nossas lâminas. Quem nos limpará desse sangue? Qual a água nos lavará? " - Assim Falava Zaratustra



A outra oração

E não foi essa a única vez que Nietzsche orou. Orou musicalmente quando, em 1842, compôs no piano Hino à Vida, sobre poema de Lou Andreas Salomé, Oracão à Vida. Nos anos seguintes, o Hino à Vida passaria a fazer parte de uma obra maior, Hino à Amizade.Já escrevi aqui no Geléia Geral sobre sua relação com Lou (http://neilatavaresgeleiageral.blogspot.com/2010/08/lou-andreas-salome-vamos-parar-com-essa.html ), marcada pela rejeição dela ao amor do grande filósofo e pela mútua admiração.

Para sorte nossa. Da dor da rejeição nasceu Assim Falava Zatustra. Da mútua admiração, nasceu um livro de Lou sobre o pensamento nietzschiano e esta peça musical.

Hino à Vida



A letra, poema de Lou, traduzida para o português

Oração à Vida

Tão certo quanto o amigo ama o amigo,
Também te amo, vida-enigma
Mesmo que em ti tenha exultado ou chorado,
mesmo que me tenhas dado prazer ou dor.

Eu te amo junto com teus pesares,
E mesmo que me devas destruir,
Me desprenderei de teus braços
Como o amigo se desprende do peito amigo.

Com toda força te abraço!
Deixa tuas chamas me inflamarem,
Deixa-me ainda no ardor da luta
Sondar mais fundo teu enigma.

Ser! Pensar milênios!
Fecha-me em teus braços:
Se já não tens felicidade a me dar
Vamos, ainda tens tua dor.


A música e o trágico

O filódofo costumava aplacar no piano suas dores do mundo. Para ele, a música é a maior expressão do trágico ( tal como entenderam por trágico os gregos).





Buscando, buscando

Sobre a relação Nietzsche-Lou, há uma bonita cena do filme Quando Nietzsche Chorou disponível no Youtube, legendada em português (7,13 min.), em que o filósofo fala a respeito, num encontro fictício, ao Dr. Breuer - psicanalista, parceiro de Freud, a quem a Psicanálise deve muitos de seus avanços, e que protanizou o Caso Anna O - que já contei aqui, em http://neilatavaresgeleiageral.blogspot.com/2010/08/fascinante-historia-de-anna-o.html.


Quando Nietzsche Chorou
(When Nietzsche Wept)



Em cena, Armand Assante ( Nitzsche)), Ben Cross ( Breuer) e Katheryn Winnick como Lou. O filme, de 2007, é de Pinchas Perry, baseado em romance homônimo de Irvin D. Yalom.