Carranca tradicional do São Francisco - híbrido de leão, homem e cavalo
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Uma questão era recorrente, durante toda a vigem ao São Francisco. A transposição das águas.
No contato com os ribeirinhos ficava bastante claro: são contra. Não encontrei um único residente das margens do rio que se dissesse a favor.
A transposição é agora já irreversível. As obras já tiveram início e será feita, não importando quantos possam ser a favor e quantos contra.
A lógica nos levaria então a pensar: “São contra porque são ribeirinhos, têm água à vontade, e não serão eles os beneficiados, mas as gentes interioranas”. Porém, as coisas não são tão simples assim, e, todos no barco, que vinham dos centros urbanos, mostravam um grande desejo de discutir isso. E logo teríamos a oportunidade.
O turismo do Benjamim Guimarães é organizado de forma bastante distinta das outras modalidades de turismo conhecidas. Inteligentemente. Difícil definir o que é aquilo: turismo cultural, ecológico? Não sei. Se pudesse usar da poética nessa definição, chamaria de turismo sensorial, feito de sabores ( a comida, mineira, regional, é maravilhosa), de contatos, de visões da natureza, de oficina de bordado mineiro ( concluí os homens são melhores bordadeiros que as mulheres), de debates inteligentes, de cantigas de viola e tambor, e, sobretudo, de muita, muita emoção, esta devida principalmente à ternura e à generosidade do sertanejo para com seus visitantes.
E lá pelas tantas, fomos informados que haveria no vapor um debate sobre a transposição com Ana Lúcia Silveira, bióloga, especialista em Gestão Ambiental e Agricultura Familiar, que trabalha na região.
Caderno de notas e caneta em punho, anotei alguns tópicos. A primeira pergunta que abriu o debate foi: a quem servirá a transposição? Ao povo, aos pobres ou às grandes monoculturas de soja e de frutas que se multiplicam no norte-e-nordeste do país? Aos pobres ou aos ricos?
"A água – dizia a bióloga – não acaba com a pobreza. Vocês viram aí a pobreza em que vivem as comunidades ribeirinhas”.
A posição da cientista não é contra a transposição. Mas contra a transposição sem que antes se faça a recuperação do São Francisco, dando outro destino ao esgoto hoje despejado, cada vez em maior quantidade, no rio, sem prévia recuperação das veredas e das matas ciliares, bastante destruídas. Enquanto falava, o vapor seguia navegando, e desfilava a olhos vistos o desbarrancamento das margens , a ausência das matas ciliares. O assoreamento cada vez mais sentido pelas embarcações com menor profundidade do rio e grandes corcovas que causam encalhes.
A Governo Federal avalia que a transposição das águas do São Francisco beneficiará 12 milhões de pessoas, enquanto 14 milhões de ribeirinhos são esquecidos.
Nestas circunstâncias de degradação, segundo a sua visão,a transposição das águas é uma agressão a mais ao Velho Chico, de consequências imprevisíveis.
Trouxe comigo materiais impressos, textos de cientistas, ambientalistas de várias áreas, para ler no Rio. Mas ainda não pude examiná-los. A vida se complica bastante nesses períodos de passagem de um ano para outro e não tenho encontrado tempo de fazer o que mais gosto: ler. Quando enfim conseguir abrir este material, prometo continuar dividindo informações aqui.
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