7 de mai. de 2009
SOLIDARIEDADE
Preste atenção ao que acontece nestas imagens. Linda, a mensagem delas. Quer dizer, uma tourada não é só o desnecessário sacrifício de um touro, contra o qual nos manifestamos com veemência.
Voltamos a nos falar na próxima semana?
Primeira Página - a Lua e a Terra
A Lua e a Terra
Só quando terminei a edição da semana, distribuindo fotos, vídeos, textos, idéias nesta página ( são dez postagens por página e por semana, nesta revistinha de cultura que inventei de fazer do Geléia Geral), me dei conta de que o amor prevalece na semanai, como tema recorrente, no texto de Artur da Távola, nos dois vídeos de vida animal; na vida, paixão e morte do poeta Lorca; no último vídeo que me chegou pelas mãos de Reluz, sobre nosso planeta. Não foi uma determinação, gerar uma edição especial sobre o tema do amor. Aconteceu. Por inspiração, coincidência? Não sei.
Pode talvez ter sido a lua-cheia, que governou, como rainha absoluta, nos céus, esta semana. Aqui, no meio da Mata Alântica, onde me encontro, impossível não vê-la. A claridade da lua ilumina a noite, os caminhos, entra pelas janelas. É mágica. E pelo menos para os românticos inveterados como eu, os românticos insolúveis, irrecuperáveis - quem duvida da influência da influência da lua sobre eles?
Experimento uma câmera fotográfica digital Sony, sem nenhuma importância, camerazinha boba, sem nenhum recurso, para saber até onde pode ser sensível ou não à incidência de luz. E fotografo a lua, na sua luz natural, sem nenhum truque. É ela, por isso - essa lua de Lumiar - que abre esta edição, toda amorosa.
Na edição da semana
- A Terra e Lua – imagens fotográficas da lua cheia de Lumiar, seguidas de vídeo institucional ode de amor a nosso planeta.
- Animais, aprendendo o amor com eles – E eles não são mesmo comoventes?
- Helios Seelinger – fotografias da tela Carnaval, do site da Pinacoteca de São Paulo.
- Walter Smetak – um dos pais do tropicalismo, e suas esculturas sonoras publicadas no site do Gilberto Gil.
- Humor – Dois vídeos. O primeiro, gostosinho, sobre a relação entre a sexta-feira, último dia da semana de trabalho, e a segunda-feira, de reinício; no segundo vídeo, uma caprichada sátira à política brasileira.
- Dicas, recados e outras – sugestões gerais de sites, blogs e temas
- Lorca - vida, paixão e morte do poeta
- Só depois dos quarenta – texto de Artur da Távola, em PÁGINA ABERTA
- Mulá Nasrudin - da série HISTÓRIAS DE NASRUDIN
No meu pedaço
E a Terra, como vai?
Para nunca esquecer das belezas deste nosso planeta.
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Henfil
O cara do Brasil
Não vou lhes apresentar HENFIL, que todos conhecem. Não vou enumerar dados biográficos, que Henfil era mais que isso. Um símbolo de luta, de coragem, um símbolo ( uma bandeira) do Brasil. Era um Iluminado. Imagino o Senhor da Vida, dizendo a um Henfil ainda etéreo, ainda em pré-vida, no minuto, no segundo antes da concepção:” Vai. Luta e vence. Teu destino é o destino de um guerreiro. Teu tempo é curto.Não o perca em vão. Dou a você o talento, em vez de espada. Será tua arma. Luta.”
Mas lutou. E venceu. Depois dele, nenhum de nós, o Brasil inteiro, nada, nunca mais foi o mesmo. Henfil era um negócio. Uma provocação, um desafio, um calafrio. Henfil era um caso sério.
Faço então aqui uma colchinha de retalhos. Textos e imagens de Henfil, para você morrer de saudades.
Lembre-se:
"Felicidade é uma viagem, não um destino".
"Enquanto os sábios pensam sem certeza, os idiotas atacam de surpresa."
(Henfil)
"Se não houver frutos Valeu a beleza das flores Se não houver flores Valeu a sombra das folhas Se não houver folhas Valeu a intenção da semente" (do livro Diretas Já)
"Se não houver frutos
Valeu a beleza das flores
Se não houver flores
Valeu a sombra das folhas
Se não houver folhas
Valeu a intenção da semente"
( do livro Diretas Já)
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Lorca
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Vida, paixão e morte do poeta
1936. Eclode a Guerra Civil Espanhola, quando rebeldes do exército, comandados por generais da direita reacionária, de orientação católica extremista, dão início ao golpe militar que deporia a 2ª República. levando ao poder o temível general Franco. O poeta e dramaturgo Federico Garcia Lorca, socialista, é preso e condenado, sem direito à defesa, e executado por fuzilamento.
O mundo se choca. Um general franquista declara que “Lorca é mais perigoso com sua pena, que muitos com seus revólveres”. Mas perseguições incitadas a outros homossexuais confirmam: Federico foi assassinado mais por suas práticas homossexuais que subversivas.
O grande poeta, nascido em Fuentevaqueros, região de Granada, amigo de Buñuel, Dali , Salinas, respeitado por toda a sua geração por sua força criativa , perfeitamente identificada com seu tempo, seu país, sua gente, sua cultura e perfeitamente universal, deixava assim a cena, aos 39 anos, para se tornar um verdadeiro símbolo, um mártir moderno, vítima da homofobia e da opressão.
Casa de Lorca em Fuentevaqueros
Três poemas de Lorca
traduzidos por William Agel de Melo
AR DE NOTURNO
Tenho muito medo das folhas mortas,
medo dos prados cheios de orvalho.
Eu vou dormir;
se não me despertas,
deixarei a teu lado meu coração frio.
O que é isso que soa bem longe,
Amor? O vento nas vidraças, amor meu !
Pus em ti colares com gemas de aurora.
Por que me abandonas neste caminho ?
Se vais muito longe, meu pássaro chora
e a verde vinha não dará seu vinho.
O que é isso que soa bem longe ?
Amor. O vento nas vidraças,
amor meu !
Nunca saberás,
esfinge de neve,
o muito que eu
haveria de te querer
essas madrugadas
quando chove
e no ramo seco
se desfaz o ninho.
O que é isso que soa
bem longe ?
Amor. O vento nas vidraças,
amor meu !
Lorca com a família, em 1912
O POETA PEDE AO SEU AMOR QUE LHE ESCREVA
Amor de minhas entranhas, morte viva,
em vão espero tua palavra escrita
e penso, com a flor que se murcha,
que se vivo sem mim quero perder-te.
O ar é imortal. A pedra inerte
nem conhece a sombra nem a evita.
Coração interior não necessita
o mel gelado que a lua verte.
Porém eu te sofri. Rasguei-me as veias,
tigre e pomba, sobre tua cintura
em duelo de kordiscos e açucenas.
Enche, pois, de palavras minha loucura
ou deixa-me viver em minha serena
noite da alma para sempre escura.
Lorca e Buñuel
Lorca e Salvador Dali
PRÓLOGO
Deixaria neste livro
toda a minha alma.
Este livro que viu
as paisagens comigo
e viveu horas santas.
Que pena dos livros
que nos enchem as mãos
de rosas e de estrelas
e lentamente passam!
Que tristeza tão funda
é olhar os retábulos
de dores e de penas
que um coração levanta!
Ver passar os espectros
de vida que se apagam,
ver o homem desnudo
em Pégaso sem asas,
ver a vida e a morte,
a síntese do mundo,
que em espaços profundos
se olham e se abraçam.
Um livro de poesias
é o outono morto:
os versos são as folhas
negras em terras brancas,
e a voz que os lê
é o sopro do vento
que lhes incute nos peitos
- entranháveis distâncias.
O poeta é uma árvore
com frutos de tristeza
e com folhas murchas
de chorar o que ama.
O poeta é o médium
da Natureza
que explica sua grandeza
por meio de palavras.
O poeta compreende
todo o incompreensível
e as coisas que se odeiam,
ele, amigas as chama.
Sabe que as veredas
são todas impossíveis,
e por isso de noite
vai por elas com calma.
Nos livros de versos,
entre rosas de sangue,
vão passando as tristes
e eternas caravanas
que fizeram ao poeta
quando chora nas tardes,
rodeado e cingido
por seus próprios fantasmas.
Poesia é amargura,
mel celeste que emana
de um favo invisível
que as almas fabricam.
Poesia é o impossível
feito possível.Harpa
que tem em vez de cordas
corações e chamas.
Poesia é a vida
que cruzamos com ânsia,
esperando o que leva
sem rumo a nossa barca.
Livros doces de versos
sãos os astros que passam
pelo silêncio mudo
para o reino do Nada,
escrevendo no céu
suas estrofes de prata.
Oh ! que penas tão fundas
e nunca remediadas,
as vozes dolorosas
que os poetas cantam !
Deixaria neste livro toda a minha alma...
PRANTO POR LORCA
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NASRUDIN E TAMERLÃO
( outras publicações desta série, veja no marcador OUTRAS HISTÓRIAS)
Nasrudin - boneco de pano, da Leela
Nasrudin surgiu ali pelos séculos 11 ou 12, em lugar deconhecido. Disputam sua origem muitos países do Oriente, como a Turquia, o Líbano, o Turquestão e outros.Mas, na opinião da maioria dos autores ,ele deve ter surgido na antiga Pérsia.
Também não se sabe se teve existência real. Há muitas lendas a respeito. Uma delas diz que foi um louco que se acreditava um Mulá. Outra, que foi um livre-pensador que, para fugir às perseguições religiosas do Islamismo, fingiu-se de louco, passando assim à tradição.
Há um túmulo de Nasrudin na Turquia. Com uma enorme porta, trancada por grossas correntes, não tem, no entanto, paredes. Nasrudin costumava dizer que "suas portas estavam sempre fechadas aos amigos e abertas aos inimigos." Talvez quisesse com isso afirmar que são os inimigos que, ao nos colocarem contra a parede, nos fazem crescer, mais que os amigos que nos protegem.
Nas histórias de hoje Nasrudin interage com Tamerlão, o Imperador.
Na sauna
Nasrudin era camareiro de Tamerlão e o acompanhava na sauna quando Tamerlão perguntou:
-Nasrudin, se eu fosse um escavo e estivesse sendo vendido no mercado, quanto você acha que pagariam por mim?
- Quarenta dinheiros - respondeu, seguro, Nasrudin.
- Só isso? Só esta toalha que eu estou vestindo custa bem mais.
_ Bom, dou quarenta dinheiros pelos dois e nem um tostão a mais.
Espelho
Tamerlão ganhou um espelho do embaixador de um país vizinho. Nunca tinha visto um e, quando abriu o presente, começou a chorar convulsivamente.
_ Por que chora, Tamerlão?
- Ah, Nasrudin, eu não sabia que era assim tão feio.
Nasrudin imediatamente começou a chorar também, aos berros.
- E você? Está chorando por que?
- Ora, se você se vê por alguns segundos e chora desse jeito, imagina eu, obrigado a olhar essa cara feia o dia todo.
SÓ SE APRENDE DEPOIS DOS 40
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do BLOGUE DO ARTUR DA TÁVOLA
Ah, que coisa comovente entrar no blogue do Artur da Távola. Parece que ele está lá, falando com a gente, com aquele seu sorrido bonito. Dizendo coisas de passarinho. Por que passarinho? Não sei, foi a imagem que me ocorreu. Um canto delicado, num único fôlego, tão leve!....
Endereço é http://www.arturdatavola.blogger.com.br/
Vai lá, vai. É um rumo bastante interessante para os navegadores que somos nós. E Paulo Alberto, no seu alter-ego de Artur da Távola, fez parte da vida da gente, da vida brasileira numa fase muito interessante. A gentese lembra mais e mais. lembra então que era, naqueles dias, em que Artur da Távola falava aos dois sexos ( ?), sim, aos dois, mas mais ainda com as mulheres. Mulheres de todas as naturezas, de todas as idades. Lembra? Lendo Paulo Alberto, a gente se lembra e se lembra mais.
Se estiver na corrida, veja só a primeira página. O blogue abre de forma surpreendente.
É do Blog do Artur da Távola o texto que se segue.
Coisas que a vida ensina depois dos 40
Amor não se implora, não se pede não se espera...
Amor se vive ou não.
Ciúmes é um sentimento inútil.
Não torna ninguém fiel a você.
Animais são anjos disfarçados,
mandados à terra por Deus para
mostrar ao homem o que é fidelidade.
Crianças aprendem com aquilo que você faz, não com o que você diz.
As pessoas que falam dos outros pra você, vão falar de você para os outros.
Perdoar e esquecer nos torna mais jovens.
Água é um santo remédio.
Deus inventou o choro para o homem não explodir.
Ausência de regras é uma regra que depende do bom senso.
Não existe comida ruim, existe comida mal temperada.
A criatividade caminha junto com a falta de grana.
Ser autêntico é a melhor e única forma de agradar.
Amigos de verdade nunca te abandonam.
O carinho é a melhor arma contra o ódio.
As diferenças tornam a vida mais bonita e colorida.
Há poesia em toda a criação divina.
Deus é o maior poeta de todos os tempos.
A música é a sobremesa da vida.
Acreditar, não faz de ninguém um tolo. Tolo é quem mente.
Filhos são presentes raros.
De tudo, o que fica é o seu nome e as lembranças acerca de suas ações.
Obrigada, desculpa, por favor, são palavras mágicas,
chaves queabrem portas para uma vida melhor
O amor... Ah, o amor...
O amor quebra barreiras, une facções,destrói preconceitos,cura doenças...
Não há vida decente sem amor!
E é certo, quem ama, é muito amado.
E vive a vida mais alegremente...
Artur da Távola
Helios Seelinger
Visões de Carnaval
Procurei esta semana por Helios Seelinger. Um dos maiores pintores de nosso país, modernista com importante participação na Semana de Arte Moderna brasileira, que dá nome a rua de São Paulo-capital, e tão pouco conhecido pelo grande público nos outros estados.
Há poucas imagens de suas telas, na internet. É preciso providenciar que se tenha mais.
Mas pelo menos uma coisa fantástica encontrei, no Flickr : sua tela mais importante ( ou conhecida), Vaidade, de 1950, hoje sob a guarda da Pinacoteca de São Paulo, fotografada em detalhes. Só lamentei não ter conseguido saber as dimensões da tela. Difícil imaginar seu tamanho. Mas vejam que artista fantástico, que obra maravilhosa do Modernismo brasileiro.
A textura das tintas, as técnicas do pintor e sua força criativa podem ser bem avaliadas nestas fotos, algumas das quais arrasto para cá. Mas há mais, naquele site.
http://www.flickr.com/photos/artexplorer/tags/heliosseelinger/
Helios Seelinger, Vaidade
Vaidade, a tela inteira
Vaidade - fragmentos da tela
Smetak
As Plásticas Sonoras
“Sou um descompositor contemporâneo”
Smetak
Anton Walter Smetak, compositor, pesquisador, professor, erudito, místico influenciado pela Sociedade Teosófica, de Helena Blavatsky , construtor de instrumentos ( e-ou esculturas), um dos mentores do topicalismo, decisiva influência na vida e na produção de Caetano Veloso, Gilberto Gil, Tomzé e Marco Antônio Guimarães, e toda a sua geração.
No site consagrado a Smetak, Augusto de Campos apresenta o músico de mil faces.
SMETAK PARA QUEM SOUBER (fragmento do texto)
Augusto de Campos
(In http://www.waltersmetak.com/index/)
“Anton Walter Smetak, suiço que adotou o Brasil em 1937, fixando-se na Bahia a partir de 1957, nasceu em 1913. É um ano mais moço que Cage. Seu primeiro disco (Philips 6349-110) só veio a ser gravado em 1974. Produzido por Roberto Santana e Caetano Veloso e montado por este e por Gil, o LP recebeu um tratamento excepcional até no seu aspecto gráfico, com a bela capa dupla que teve orientação visual de Rogério Duarte. Não fora o apoio dos baianos, provavelmente Smetak seria até hoje ignorado.
Violoncelista, criador de música e de instrumentos-esculturas ("plásticas sonoras"), a partir da combinação cabaça & cordas, Smetak é também teórico, e tem expressado sua idéias cósmico-musicais em textos e entrevistas, num português aproximativo, entre poético e místico. Anton Walter Smetak, suiço que adotou o Brasil em 1937, fixando-se na Bahia a partir de 1957, nasceu em 1913. É um ano mais moço que Cage. Seu primeiro disco (Philips 6349-110) só veio a ser gravado em 1974. Produzido por Roberto Santana e Caetano Veloso e montado por este e por Gil, o LP recebeu um tratamento excepcional até no seu aspecto gráfico, com a bela capa dupla que teve orientação visual de Rogério Duarte. Não fora o apoio dos baianos, provavelmente Smetak seria até hoje ignorado.
Walter Smetak construiu cerca de 150 instrumentos - esculturas, as "plásticas sonoras", que se encontram hoje reunidas na Biblioteca Reitor Macedo Costa, no campus de Ondina, Salvador. São instumentos musicais criados com cabaças, bambus, tubos de PVC e toda sorte de materiais inusitados. Cor-forma-som obedecem ao rigor de um místico, nas suas combinações. Walter Smetak procurava um som antigo, " de um passado que nunca existiu".
As fotos das Sonoras aqui publicadas, de Rômulo Fialdini, estão no site de Gilberto Gil -
http://old.gilbertogil.com.br/smetak/takpl_0.htm
Imprevisto
Disco Voador
Colóquio
Choris
Borés
Amém
"O fim da fala ainda não é o início do silêncio" ( Smetak)
Se quiser mais sobre Smetak, no mesmo site ( waltersmetak.com) ,encontrei este texto escrito por ele mesmo, em que define sua obra e pensamento. Um documento e tanto!
(À esquerda, página de partitura de Anestesia )
Em potencial, sem realidade porém...
No primeiro período do trabalho, desconhecia o contexto de uma pesquisa exata, pois o intuito era mais de colaborar com a música contemporânea. Julguei, no meu modo de ver, primeiro que a música contemporânea devia ser feita com instrumentos não tradicionais, como composição à parte da música geralmente pretendida.
Foram construídas algumas dezenas de instrumentos, que podem ser considerados antecessores primitivos do que foram catalogados mais tarde como instrumentos tradicionais no Ocidente.
Ciente, pois, no decorrer do trabalho, de que o meu conhecimento histórico em matéria de instrumentos, era insuficiente, devido aos séculos decorridos desde a.C., percebi que a tal "pesquisa" se iniciava, já que era justamente pretensão nossa entrar na época contemporânea sem conhecer realmente o "início" das coisas no mundo dos planos vibratórios, extensivos à todos os ramos das artes. Confundia primitivismo com contemporaneidade, enganando muita gente e a mim mesmo, conseguindo pelo menos, ao destruir velhos conceitos,tornar-me amorfo.
Vale salientar que a pesquisa aqui iniciada teve por único incentivo, a iniciativa própria, sem nenhum recurso de CNPQ ou outro órgão oficial. Entendi que tinha entrado na dura fase de "recuperação do passado desconhecido" a fim de poder enfrentar a contemporaneidade, que por sua vez nada tinha a ver com o futuro. O pensamento do futuro, socialmente falando, afastou-se. A minha presença no presente era a única forma de me achar na existência. Fiquei assim sem tempo determinado, dedicando-me, de várias maneiras, às artes, seja como músico, artesão ou literato, tentando fixar o momento da minha eternidade.
Surgiram instrumentos cinéticos, instrumentos coletivos, e sobretudo um acontecimento deslumbrante: um professor ou mestre vindo de um remoto passado, e que era a Harpa Eólica. Daí por diante, ela me serviu de guia. Começou assim o processo de dissolução nos sistemas dos microvalores, conhecidos na música como microtons. Surgiu a pergunta: como resolver esses problemas, seja electronicamente, seja naturalmente. Faltavam recursos materiais como intelectuais, e não havia ninguém para se consultar. Faltava também estabilidade e salas adequadas para o bom procedimento do trabalho, sofrendo-se várias mudanças, quebras pelo transporte, roubo de peças e até inundações por esgotos quebrados. Ficou intacta apenas a oficina, a mesma tornando-se refúgio para os instrumentos quebrados. A pesquisa tornou-se uma reforma.
Aprendi que espaço significa forma, e tempo: mente sempre variável. Em paralelo a isso, o espaço contém uma energia atômica, podia ser o electron, circundada pela mente instável. Nas composições harmoniosas, NÃO ACONTECE NADA, apenas modulações harmoniosas, descrevendo uma natureza equilibrada. Nas composições dissonantes porém, chocantes, onde as dissonâncias abrem o caminho para acontecimentos sonoros, acontecem pequenas explosões no cérebro, veículo da mente humana. Pode tanto amansar como excitar. Os acontecimentos exteriores não devem influenciar, neste caso a composição tornar-se-ía um noticiário. Esse processo deve ser levado ao interior do ser humano, a fim de neutralizar os choques. Daí pode surgir uma compaixão interior.
A dualidade (divisão do + e - ) é confundida com o dualismo (discussão entre + e - ). Na dualidade existe homogenidade. A contemporaneidade parece ser um fenômeno do dualismo.
Resumindo: no homem existe uma mulher, e na mulher existe um homem. Tão separados apenas pelo sexo. O homem se exterioriza e a mulher se interioriza. Mas na verdade as duas unidades são a dualidade unificada. Esta concepção nos afastou dos acontecimentos, visando mais o pós-imediato do que o imediato. Aí entramos no próximo segundo (do futuro digamos), que se torna presente.
Houve uma conclusão muito significativa ao considerarmos a "Ronda", onde descobrimos que ritmo, melodia e harmonia dependem da velocidadedo giro, isto é: velocidade máxima produz harmonias, carrossel celeste; velocidade média: melodias ou sons lineares, e finalmente ritmos: velocidade mínima. Estas velocidades podem ser usadas alternativamente (nativamente=nascer), porque em matéria de composição ou improvisação, não há regras fixas e sim justificativas, dependendo do caso.
Chegamos a outra consideração: podiam essas pretensões alterar os sistemas sonoros e musicais? Porque constatamos que o instrumento adequado produz um certo tipo de som ou música, mas a música é feita conforme o padrão inerente ao homem. O homem sempre reproduziu o clima do sistema geográfico ambiente. Existem casos de poliglotas universais, tal como Stravinski, que pode ser acusado de ter uma consciência universal, pois vive todos os mundos. Ele é tão litúrgico como dançante. Ele é ao mesmo tempo super-antigo e super-moderno, e tem essa faculdade de reunir o passado e o futuro no eterno presente. As estações fundidas numa só estação. Satélites girando ao redor do centro universal.
A tese, ou hipótese de criar novos instrumentos, cai quase por terra: surgiu o problema da timbragem. A electrônica, com seus sons artificiais (gerados no vacuum ou além das estrelas) é uma porta. Existe porém o perigo da dualidade cair no dualismo. Temos que estar alertos para superar o automatismo da nossa proclamação do "do-ré-mi-fa-sol-la-sismo". Na antiguidade existia um poderoso significativo esotérico, que paulatinamente formou as escalas. Eram os sete planetas, dotados de suas vibrações específicas, tomando parte dos calendários Maya e egípcio.
Segue o esquema: MA = dó (marte); SO=ré (sol); ME=mi (mercúrio); SA=fa (saturno); JUI=sol (júpiter); VE=la (vênus); LU=si (lua). Ou seja: a primeira sílaba dos planetas marte, sol, mercúrio, saturno, júpiter, vênus e lua.
Esses planetas eram divididos em neutros, benéficos e maléficos, conforme a ciência da astrologia, caindo mais tarde na astronomia. Este mistério é reproduzido no dodecafonismo, ou seja, na extensão de 7 para 12 tons, que é o "do-ré-mi-fa-sol-la-sismo". Ao reconscientizar o sistema antigo, pode acontecer que o chumbo se transforme novamente em ouro filosofal.
Existe uma grande falha na língua portuguesa ao denominar os dias da semana por "feiras", com excessão de sábado e domingo pois em todas outras línguas latinas existe a relação planeta-dia. Talvez seja devido as feiras montadas nos diversos pontos da cidade, denotando assim o espírito mercantil português.
Essa época dos microtons representou a mais rica fase da pesquisa, culminando em Berlim 1982 na construção de sete monocórdios e uma oitava de microtons (49 por oitava).
Paralelamente tivemos um profundo olhar na mais moderna e atual eletrônica e ficamos com grandes dúvidas quanto à continuação do trabalho.
Sofremos três greves, várias mudanças do material, e finalmente, obtemos um acampamento para os instrumentos, na menor sala possível, a pesquisa exterior transferiu-se para o interior, passando da materialização do som para a música, palavra, plástica, o verbo, e finalmente o silêncio, fonte de toda manifestação universal.
Seguiram alguns trabalhos escritos, plásticas de barro, solidão e recolhimento.
Em soma, recomendamos este tipo de pesquisa autodidata "in loco" àqueles tateando num trabalho não subvencionado, orientados por um sentimento de aprofundamento no conhecimento, podendo assim terem um vislumbre da Sabedoria e do Amor existindo na Eternidade da Existência dos universos, cujo retrato são os instrumentos, num mundo de miniaturas das nossas artes humanizadas. MICROCOSMO. Conhecer esse único instrumento que é o HOMEM. Conscientizar a palavra música no seu sentido inverso: Ak-Is-Um, ou seja: Akasha (éter sonoro e luz), Isis = a bela luz, Um: a Unidade que abrange os três em Um. É necessário voltar do concretismo para o abstraismo do amorfo, para o caos homogêneo e indiferenciado, e de lá buscar o ainda não existente materialmente, e ter a capacidade de dissolver as descobertas imediatamente, porque atrás ainda vem muita gente. Raças nascidas do lixo atômico.
Vale notar o exemplo do genial artista Mário Cravo, no monumento (momento da consciência), onde ultrapassa o sentido de homenagem política, na quadratura do círculo erguida em 1982 na Avenida Garibaldi. Um instrumento de cimento armado contendo uma silenciosa e poderosa palavra clamando os céus.
Após 15 anos de labor, conseguimos uma quantidade razoável de timbres novos, houve um relaxamento de maneira tão inesperada que esta experiência total dos instrumentos voltou-se para o violoncelo, quando um dia, numa improvisação, uma síntese de todas as experiências adquiridas no trabalho anterior, nasceram duas peças denominadas "Facho de Luz". Era o final do disco "Interregno" que por um descuido, não foi incluido naquele disco, ficando assim anônimo para o público.
Daí adiante, as forças criativas cessaram, surgindo apenas mais um novo problema: será que tocar significa viver com intensidade artísticamente, ou é uma falsa projeção entre o não ser das artes e a vida? Esta pergunta não me foi respondida até hoje. Senti uma força desconhecida chegar com tanta veemência, não era eu, virei público ouvindo alguém. A música era um ser bem superior a mim, entretanto tomou conta de mim integralmente, como se fosse eu mesmo. Mas ao terminar, voltei a ser um homem comum como qualquer outro, sem poder me manter neste alto nível anterior. Tive a nítida noção de que era necessário fazer aquilo, pouco importando quem servia de instrumento. Viví daí adiante como espectado, observando as emoções, vibrando as vezes, ouvindo música como se fosse minha. Soube finalmente apreciar tudo que era nobre e raro, e senti de fato um gênio dirigindo as coisas belas que acontecem no palco da vida. Embora me sentindo um miserável mortal, senti a celebração da imortalidade.
Fechei o expediente, não há mais ninguém com quem me comunicar, e por força maior, dei por terminada a pesquisa, embora houvesse ainda necessidade de certa codificação. Ví com toda clareza que nada de novo tinha sido criado, apenas redescoberto por iniciativa própria, com a única pretensão de conquistar e descobrir sozinho os novos continentes, tateando do conhecido para o desconhecido. Este caminho traz muitas felicidades, muitas angústias também, porque, como foi dito anteriormente, a realidade não corresponde ao potencial, mas o Som, também invertido em Luz, pode levar o homem a ter um vislumbre da Existência.
Recomendamos esse tipo de trabalho, incluido num currículum universitário, para ser prosseguido por outra pessoa corajosa, disposta a um supremo sacrifício.
Possívelmente a pesquisa pode encontrar-se, em pouco tempo, contemplando o "NADA". Isto é: ficar sem tempo, sem espaço e sem condições e quando soar esta hora, virá a crise total, de dentro para fora, encontrando esta vastidão de camadas culturais que o homem adquiriu durante séculos e séculos, e ele terá de se confrontar com o NADA, inerente ao TODO. Forçosamente o homem terá que voltar ao interior, e lá permanecer, lá onde reside o Nada, aquele Nada porém, que nunca nasceu e daí não pode morrer. Só assim o trabalho poderá recomeçar, destruindo as citadas camadas culturais, apodrecidas e gastas. Eis a diferença entre o criado e o Criador.
Uma crise desta envoltura, com certeza se empenhará em trazer um outro estado de consciência, um novo tipo humano, uma palavra nova e um SOM diferente. Creio que, deste momento em diante, a Pesquisa pode começar, uma vez cortados os laços com a velha cultura em estado delirante.
Salvador, 27 de julho de 1983.
Walter Smetak
"O caminho dos instrumentos foi longe, demasiadamente longe. Começou com o trovão e terminará com o trovão. Seguirá um vasto silêncio. E, por outra vez, o Som terá que dar vida às coisas deste mundo tão belo..." (Walter Smetak)