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12 de jan. de 2009

Como diz a sabedoria popular, mãe é bom mas dura muito

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Vejo que minha publicação de domingo, a respeito da Mãe cristalizada, mexeu com meu leitor. Filhos e mães respondem-me em emails, apoiando ou atacando minha posição de que Mãe tem prazo de validade, e que este vence quando os filhos atingem a idade adulta.

E vou lhes contar mais. Tenho uma amiga, Vitória Pamplona, psicóloga, especializada em gestação,profissional reconhecida e competentíssima, com mais de 40 anos de experiência nesta área. Seu site, se quiserem conhecê-la melhor, é http://www.gestando.com/.

Todos sabemos que a gestação não é um fato isolado, mas inclui todos os aspectos da sexualidade. E Vitória os estuda, todos. Trabalha incansavelmente sobre eles, em todos estes anos. Seus 40 anos de profissão equivalem a tempo igual em que convivemos estreitamente, e acompanho de perto suas pesquisas. Somos tão próximas que, basta dizer, estive com ela na sala de parto, quando deu à luz sua filha mais nova, Juliana, hoje chegando aos 30 anos. E estivemos de novo juntas em outra sala de parto, quando Marta, minha filha, deu à luz Nayara, há dois anos.

Aprendi muito com Vitória. Com ela me dei conta de que uma gestação saudável, um parto saudável, uma saudável relação com a maternidade e o aleitamento, dependem também de enfrentarmos , de questionarmos, de trabalharmos em nós outras questões, como religiosidade, mitos sociais, etc. E de conhecer, tanto quanto possível, os processos físicos e psicológicos porque passa o casal durante a gestação. De conhecer, além disso, os procedimentos médicos usuais. Mais: me dei conta de que, num país campeão em cesarianas, o direito de parir em paz, de escolher a forma como se vai parir ( e que seja a melhor para mãe e filho, claro, e sempre) é, aqui, uma luta política.

Vitória não é contra a cesariana. Ao contrário, bendiz o fato de haver este recurso. Para ser usado quando necessário. Mas admite que esta é apenas uma das formas de parto. E que há muitas outras ao dispor da parturiente,e que, entre elas, haverá uma que será mais adequada àquela pessoa e circunstância.Mesmo que seja a cesariana.

Estamos bastante atrasados no Brasil, em relação aos partos. Há países, por exemplo, em que toda a família, incluindo as crianças, é convocada a assistir e participar do parto. É um evento eminentemente familiar. Aqui, a parturiente está só e só recentemente os homens ( pais) começaram a ser admitidos nas salas de parto. E nem em todas as clínicas, nem por todos os médicos. A participação do pai ainda tem sabor de concessão, não de direito. E assim mesmo para os mais abastados. O pobres ficam mesmo alijados desta participação, na maioria dos hospitais públicos ou interioranos. Médicos todo-poderosos decidem procedimentos e mal os comunicam às clientes. Decidem eles unilateralmente se devem aplicar uma injeção para aplacar a famosa “dor”, se devem apressar ou não os partos, de acordo com suas agendas e suas próprias ansiedades. E a luta de Vitória é para que a paciente tenha direito à informação e à voz, e possa tomar também decisões com relação a seu parto, discutir com o médico, questioná-lo sobre a necessidade ou não de algum procedimento.

Recentemente, para escrever um artigo, Vitória visitou as grandes livrarias, todas, seções de livros infantis. Há hoje uma vasta literatura infantil, que pretende ensinar às crianças como nascem elas. Comprou 15 livros, escritos e assinados por pedagogos e sexólogos bem preparados academicamente. Todos, à exceção de um, valorizavam excessivamente a dor do parto. E apenas um dizia: “com ou sem dor”- bem mais verdadeiro, quando sabemos que há partos indolores, assim como há mulheres mais ou menos resistentes à dor, e assim como a resistência e a intensidade da “dor” também dependerão de uma maior ou menor preparação para ela, das condições de segurança em que se sentirá a parturiente, de suas condições de relaxamento, etc... e do maior ou menor fortalecimento deste mito. Alguns destes livros infantis, tão bem assinados, apresentam às crianças um quadro de verdadeiro terror. E isso, quando já há bem mais de trinta anos vem se discutindo estas questões da maternidade, em suas formas inaugurais.

A questão é simples aí. Continuamos a deificar a mãe, a acreditar e a ensinar a nossas crianças que quanto mais dolorosa for a maternidade, quanto mais padecimento trouxer, mais será a Mãe admirável e santa. E como santa se é por toda a eternidade, para além da vida e para além da morte, continuaremos a ser A Mãe, acima de tudo, mesmo quando esta Figura não corresponde mais à necessidade de ninguém.

A partir do parto, e pelos próximos 20 ou 30 anos, quando os filhos chegam agora à idade verdadeiramente adulta, somos Mães, em primeiro lugar. Antes de profissionais, antes de esposas ou amantes, antes de tudo, Mãe. É essa a nossa identidade principal. E é natural. Os filhos precisam de nós, para sobreviver. Nós os alimentaremos, agasalharemos, ensinaremos a falar, a andar, cuidaremos na doença, ensinaremos o caráter, a Ética, os socializaremos... Nós os amaremos mais que a nós mesmas, porque assim o exige a vida, tantas são as necessidades do bicho homem de proteção, para a sobrevivência da espécie. Somos, os homens, tão frágeis na infância, se comparados a outros mamíferos.

E depois? Eis o que quero começar a discutir agora. E depois? Demos aos filhos régua e compasso, mas seu caminho nesse mundo traçam eles. E depois?

Depois – a natureza é sábia, ainda, no depois – e , nela, tudo que não é mais necessário se atrofia, desvitaliza. Se não extinguimos a Mãe desnecessária de filhos adultos, se não a matamos metaforicamente, seremos a Mãe atrofiada, sombra de si mesma, histérica e inútil, a perturbar os filhos, a pesar-lhes com um amor obsessivo e ilimitado, que a tudo resiste e a nada se compara, quando já não precisam desta qualidade de amor. Porque o Amor entre adultos é, por sua própria natureza, leve, volátil, não tem esse peso todo. O Amor se desenvolve e renova em ambiente arejado, relaxado, não tensionado e rarefeito. O Amor é inteligente, não irracional. E gosta de respostas. Avança e se retrai, de acordo com o que vem do outro. O absolutismo do amor materno se torna chato, incômodo, sem lugar na vida do filho adulto. Já ouviu a expressão ”Ame-me menos”? Pois é.

Até um passado recente, as mães morriam coincidentemente quando os filhos ficavam adultos. Hoje somos mais longevas. A vida perdura para além da necessidade de nosso papel de Mãe. O Papel acaba, a vida continua, e ainda estamos fortes e lúcidas e sexualizadas e – se Deus o permitir, e nós também - ainda cheias de sonhos e de projetos e de idéias e coisas por fazer. Não será mais lógico, mais sábio, mais feliz para todos, saber a hora de abdicar dessa Maternidade inútil e ir em frente, viver outras coisas? Não será mais generoso? Não será uma Graça que tenhamos hoje a oportunidade de voltar a ser nós mesmas nossa prioridade, ainda em pleno vigor, depois de tanto priorizar os filhos? E não será essa uma oportunidade fantástica de vivermos com eles uma outra qualidade de amor, amadurecido, são, alegre... de delicioso companheirismo?








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