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Uma, não. Três
Este poema, do poeta inglês John Donne (1572-1631), contemporâneo de Shakespeare ( shkspr, como escreve Augusto de Campos, em John Donne, O Dom e a Danação )- é uma obra-prima da arte erótica universal.
Melhor dizendo, três. Três obras-primas.
A primeira é o poema em si, tal como foi escrito, em inglês.
A segunda é a tradução de Augusto de Campos, tão re-criativa – quando a lógica de nosso idioma assim o exige - quanto fiel, nascida em pleno Tropicalismo.
A terceira, quando a tradução recebe melodia de Péricles Cavalcanti, gravada por Caetano Veloso em Cinema Transcendental.
Elegia, Indo para o Leito
(John Donne, em tradução de Augusto de Campos, in John Donne, O Dom e a Danação)
Vem, Dama, vem, que eu desafio a paz;
Até que eu lute, em luta o corpo jaz.
Como o inimigo diante do inimigo,
Canso-me de esperar se nunca brigo.
Solta esse cinto sideral que vela,
Céu cintilante, área ainda mais bela.
Desata esse corpete constelado,
Feito para deter o olhar ousado.
Entrega-te ao torpor que se derrama
De ti a mim, dizendo: hora de cama.
Tira o espartilho, quero descoberto
O que ele guarda, quieto, tão de perto.
O corpo que de tuas saias sai
É um campo em flor quando a sombra se esvai.
Arranca essa Grinalda armada e deixa
Que cresça o diadema da madeixa.
Tira os sapatos e entra sem receio
Nesse templo de amor que é o nosso leito.
Os anjos mostram-se num branco véu
Aos homens. Tu, meu anjo, és como o céu
De Maomé. E se no branco têm contigo
Semelhança os espíritos, distingo:
O que o meu anjo põe, não é
O cabelo, mas sim a carne em pé.
Deixa que a minha mão errante adentre
Atrás, na frente, em cima, embaixo, entre,
Minha América! Minha terra à vista,
Reino de paz, se um homem só a conquista,
Minha Mina preciosa, meu Império,
Feliz de quem penetre o teu mistério!
Liberto-me ficando teu escravo;
Onde cai minha mão, meu selo gravo.
Nudez total! Todo prazer provém
De um corpo ( como a alma sem corpo) sem
Vestes. As jóias que a mulher ostenta
São como as bolas de ouro de Atalanta:
O olho do tolo que uma gema inflama
Ilude-se com ela e perde a dama.
Como encadernação vistosa, feita
Para iletrados a mulher se enfeita;
Mas ela é um livro místico e somente
A alguns ( a que tal graça se consente)
É dado lê-la. Eu sou um que sabe;
Como se diante da parteira, abre-
-Te: atira, sim, o linho branco fora,
Nem penitência nem decência agora.
Para ensinar-te eu me desnudo antes;
A coberta de um homem te é bastante.
Explore o site de Augusto de Campos:
http://www.revista.agulha.nom.br/ac.html
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26 de set. de 2008
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