As quadras cairam em desuso neste século. Mas já tiveram seu lugar de honra e de popularidade na poesia. Em certos tempos, morreram, dormiram... para depois acordar. Diletas filhas e irmãs das trovas medievais, as quadras são formas essenciais da poesia, sintéticas, enxutas, que, no modelo mais tradicional ( e mais próximo da trova medieval), contam com quatro versos de sete sílabas e obrigatórias rimas ( as mais usuais são ABAB, mas também podem ser outras: AABB, ABBA) que façam um sentido, contem uma história, descrevam uma visão, uma idéia completa.

Quadras de Fernando Pessoa
Se eu te pudesse dizer
O que nunca te direi,
Tu terias que entender
Aquilo que nem eu sei.
Dias são dias, e noites
São noites e não dormi...
Os dias a não te ver
As noites pensando em ti.
Teus brincos dançam se voltas
A cabeça a perguntar.
São como andorinhas soltas
Que inda não sabem voar.
Tenho vontade de ver-te
Mas não sei como acertar.
Passeias onde não ando,
Andas sem eu te encontrar.
Meu coração a bater
Parece estar-me a lembrar
Que, se um dia te esquecer,
Será por ele parar.
As trovas de Cecília
As trovas surgiram lá pelos séculos 12 ou 13, escritas em árabe. Levadas à Espanha pelos mouros, foram adotadas no Ocidente onde explodiram em popularidade do século 19 à metade do 20 - especialmente em Portugal - transformaram-se, ajustaram-se à poesia moderna, algumas perderam métrica e rimas ( trovas livres), mas mantendo sempre os quatro versos e a coerência do discurso.
Com a boa tradição literária portuguesa, as quadras chegaram ao Brasil, caíram no gosto dos poetas populares e da elite intelectual. E quase todos os poetas brasileiros dos século 20 fizeram quadras. Como Cecília Meirelles.
Ao lado da minha casa
morre o sol e nasce o vento.
O vento me traz o seu nome,
leva o sol meu pensamento.
Passarinho ambicioso
fez nas nuvens o seu ninho.
quando as nuvens forem chuva,
pobre de ti, passarinho.
Os remos batem nas águas:
tem de ferir, para andar.
As águas vão consentindo
esse é o destino do mar.
Na canção que vai ficando
já não vai ficando nada:
é menos do que o perfume
de uma rosa desfolhada.
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