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13 de mai. de 2009

SOUSÂNDRADE

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Loucura ou Utopia?


Num relâmpago

o tigre

atrás da corça em sempre imóvel íris

verde-neve azul jacinto

e as abrasadas rosas

no ar circunvoando vivo-escarlatas

indolentemente




O quase fim

A história da vida de Sousândrade e de sua sobrevida como poeta no cenário da literatura brasileira são igualmente impressionantes.

Poeta maranhense, romântico rebelado ( contra o capitalismo, a opressão política, a corrupção intransigência , o pânico do novo, a hegemonia norteamericana,e até mesmo contra o Romantismo), rebelde incompreendido, incontrolável, erudito, com uma produção à frente de seu tempo, terminou seus dias empobrecido, abandonado, esquecido, confinado num hospício, em 1912, aos 44 anos. Nos últimos dias de liberdade, era tão pobre que vendeu as pedras do muro de sua casa, episódio que se tornou piada na cidade. Tão louco, que outras pedras lhe atiravam os meninos nas ruas, a ponto de a Prefeitura de São Luís se ver obrigada a interferir, penalizando quem o molestasse.

Seus últimos versos foram usados como papel de embrulho. O resto de sua produção, condenada ao esquecimento.


Ressurge a obra

Nos anos 60, redescoberto pelos irmãos Augusto e Haroldo de Campos , que publicaram Re Visão de Sousândrade – antologia com estudos críticos, e que representaria a redenção da obra do poeta. Por suas mãos Sousândrade chegou a Caetano Veloso, que musicou alguns de seus versos, em Gilberto Misterioso ("gil engendra em gil-rouxinol"), canção incluída no disco Araçá Azul. Nos anos 80, Caetano voltou à parceria com o poeta de São Luís, na canção Ele me deu um beijo na boca ("... toca de raposa bêbada"), em Cores e Nomes.

E Sousândrade brilhou como mais uma das estrelas do Tropicalismo – que procurava a identidade brasileira na fusão entre o passado e o presente (futuro). Sousândrade sacudiu a juventude atenta.




A um flilólogo


cuja língua
áspera se enrosca corusca no dentes
de entrechoque
com siderações
e que chove nas linguo-
dentais - eis o detalhe-
de suas palavras que aspiram
vingança na amarela janela
de seu sorriso

Declina sem aura
translitera e não exaure
expectora indeciso
o sol das sibilantes
sem força inane
Se arca ao peso dos pés

Não examina atrás das orelhas
onde exânime mínguam
as últimas cócegas
das fricativas
ao filho logro

Agora mordendo os lóbulos
ensurdecido grite o errante
guesa na língua estranha
portuguesa


As cifras que não ancoram
no seu manual
nem trincam a língua
no salobre de sua saliva

Impossível senso uma lira
de harpas selvagens
como farpas pois
te falta o ar das eólias
infante arfando órfão

Te falta Orfeu e te embala
Morfeu na baba viscosa
dos teus morfemas açucarados
dos teus temores se desdobra
o demônio abantesma

Da inércia dos teus suores
teus rancores pudicos
teu repudio ao diverso
teus tremores sísmicos
em torno a ti mesmo
ciclo artificioso
No teu pensar vive
Incrustado sanguessuga




Entre os maiores


Com dois títulos universitários na Sorbonne, viagens pelo mundo, domínio de vários idiomas, republicano no modelo utópico da República de Platão, Sousândrade participou da Comissão que redigiu a primeira Constituição do Maranhão. Tinha um profundo conhecimento da mitologia sulamericana e pregava a idéia da busca de uma identidade continental.


Sua obra mais instigante é O Guesa Errante - um poema longo, uma epopéia, que levou 30 anos escrevendo ( 1954 a 1984) e deixou interminado. É a história de Guesa, um jovem que deveria ser sacrificado ao Deus Bochicha, deus do Sol, entre os Muíscas, da Colômbia, e sai em peregrinação, dos Andes à Floresta Amazônica, da Venezuela à Europa, da África ao Maranhão, e chega ao Wall Street, sede do nascente Império Norteamericano.

Sousândrade é hoje reconhecido como um dos mais importantes poetas de nossa língua. Seus versos são vistos como inovadores, que prenunciavam o Movimento Modernista de 22.


Flirtations
(Manhattanville)

Ninguém ande à encruzilhada
Por noites de São João
-Vejam a mal-assombrada,
Meninas! “Oh, a visão!…”

- Cora, qual é tua sorte?
“Na Quinta Avenida, à corte,
Casarei.”
- Sempre never cada Fanny?
"Morrerei.”

- E tu, Augusta, rubores?
Vão ver, que sorte de amores…
“Eu sonhei.”
Pior do que encruzilhadas
De visões; portas e escadas
Destes céus de Manhattan


Com que aí stão-se aninhando
Alvoradas? matinando
Toda a noite até manhã?
“Fogo! fogo! é rato! é gato!”

- Matinada de Babel!
Meninas, mudem de quarto,
Há mais quem durma no hotel!

São as três; doirada tarde,
Vêm da escola e em risos ledos,
O olhar longínquo de que arde,
Atiram beijos co’os dedos.

Ora, estudando as lições:
“Diga, diga, as professoras
Deram tese - Os dois vulcões
Maiores -Belas senhoras,

Há crescenças… sobre os Andes
Que são da terra as mais grandes…
Rindo Fanny, Cora alada
E ar Augusta de graduada

-“Andes são serras: vulcões,
Sir! os maiores do mundo!?”
- Oh! que estão no céu profundo
Chamas lançando em festões?


“Yes! Yes!”
- Que rugem? ’strugem
Com lavas bravas?!
“Yes! Yes!”


- São, my girls, dois corações…
“Oh! oh! oh!”


Harpa XXXII
Dos rubros flancos do redondo oceano
Com suas asas de luz prendendo a terra
O sol eu vi nascer, jovem formoso
Desordenando pelos ombros de ouro


A perfumada luminosa coma,
Nas faces de um calor que amor acende
Sorriso de coral deixava errante.
Em torno de mim não tragas os teus raios,
Suspende, sol de fogo! tu, que outrora

Em cândidas canções eu te saudava
Nesta hora d'esperança, ergue-te e passa
Sem ouvir minha lira.


Quando infante
Nos pés do laranjal adormecido,
Orvalhado das flores que choviam
Cheirosas dentre o ramo e a bela fruta,


Na terra de meus pais eu despertava,
Minhas irmãs sorrindo, e o canto e aromas,
E o sussurrar da rúbida mangueira
Eram teus raios que primeiro vinham
Roçar-me as cordas do alaúde brando

Nos meus joelhos tímidos vagindo.









Veja biografia de Sousândrade na Wikipédia














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