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5 de dez. de 2008

Viagem de Camus ao Brasil - Rio de Janeiro

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Nova Friburgo é uma cidade sem livrarias. Paradoxalmente, tem excelentes sebos.
A cidade está distante de minha casa cerca de meia hora.

A razão não é a distância de eu ir tão pouco ao centro. É que cansei das cidades e me acostumei ao silêncio e ao isolamento. Mas quando vou, vou a um sebo, sempre. E esta semana encontrei um livro importante: Albert Camus, Diário de Viagem. A visita de Camus ao Brasil, editado pela Record (RJ), Copyright Éditions Gallimard, 1978. Não há nome do tradutor, na edição, mas seja quem for, teve o bom gosto de guardar palavras e nomes na grafia original, de Camus, tal como os ouvia e anotava ele, que não conhecia o português.

Romancista e filósofo argelino, que viveu em Paris – um dos mais importantes filósofos do século 20 - Albert Camus (1913-1960), de junho a agosto de 1949, andou pela América do Sul, num contrato que incluía conferências, visitas a universidades, contatos com intelectuais de cada país,etc.

No Rio de Janeiro, espantou-se com a grande quantidade de neons, de todas as cores, espalhados em toda a cidade, à luz dos quais resplandecia. Vejamos alguns trechos reveladores do Rio de Janeiro que Camus encontrou e da forma como o assimilou.

A 30 de junho ele sai de Paris, de navio.

No amanhecer de 15 de julho o navio adentra a Baía de Guanabara. Escreve Camus:

“...E vemos as luzes do Rio correndo ao longo da costa, o Pão-de-Açucar com quatro luzes no seu topo, e no mais alto cume das montanhas, que parecem esmagar a cidade, um imenso e lamentável Cristo luminoso. À medida que nasce a luz, vê-se melhor a cidade, espremida entre o mar e as montanhas, estendida no comprimento, interminavelmente estirada. No centro, prédios enormes......A riqueza e a suntuosidade das cores que brincam sobre a baía, as montanhas e o céu, fazem calar a todos...”

"... Os motoristas brasileiros ou são alegres loucos ou frios sádicos. A confusão e a anarquia deste trânsito só obedecem a uma lei: Chegar primeiro, custe o que custar."


"... O contraste mais impressionante é fornecido pela ostentação de luxo dos palácios e dos prédios modernos, com as favelas, agarradas ao flanco dos morros, sem água nem luz, onde vive uma população miserável, negra e branca. ... Nunca o luxo e a miséria me pareceram tão insolentemente mesclados.”

"... Na volta, num lotaçao, espécie de táxi coletivo, assistimos a um dos inúmeros acidentes provocados pelo trânsito inverossímil. Um pobre velho negro mal embrenhado numa avenida rutilante de luzes é colhido por ônibus, que o lança dez metros à frente, como uma bola de tênis, contorna-o e foge. Isto se deve à estúpida lei de flagrante delito, segundo a qual o motorista teria sido levado à prisão. Portanto, ele foge, não há mais flagrante delito e não será preso."

19 de julho
"... Jantar na casa de Chapass, com o poeta nacional Manuel Bandera, pequeno homem extremamente fino. Depois do jantar, Kaimi (Dorival Caymi) , um negro que compõe e canta todos os sambas que o país canta, vem cantar com seu violão. São as canções mais tristes e mais comoventes. O mar e o amor, a saudade da Bahia. Pouco a pouco, todos cantam e vê-se um negro, um deputado, um professor da Faculdade e um tabelião cantarem esses sambas em coro, com uma graça muito natural. Totalmente seduzido.”



Já o poeta Augusto Frederico Schmidt, que Camus chamará por o poeta, S., ou Federico , não é apresentado com tanta simpatia. O acompanhante servil, todo o tempo ao lado do poeta, será chamado por ele apenas de Señorito. Neste trecho do diário, Schmidt o leva a jantar no Mercado ( Praça XV) :

"... Servem primeiro o poeta, que começa a comer sem esperar por nós, substituindo às vezes o garfo pelos dedos curtos e grossos. Fala de Michaux, Supervielle, Béguin, etc, e interrompe-se, vez por outra, para cuspir no prato, lá de cima, as espinhas de seu peixe. É a primeira vez que vejo fazer-se essa operação sem curvar o corpo. Aliás, com uma destreza maravilhosa, ele só não acerta o prato uma vez..."

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